Declarações de amor e ódio ao celular

Enquanto há pessoas que não vivem sem o aparelho móvel, outros resistem à tecnologia

Folha de Londrina | 21 de outubro de 2008


''Uso muito o orelhão para me comunicar com a minha casa, faço contato para dizer onde estou'', afirma o colunista da FOLHA, Luiz Geraldo Mazza, 77. ''Não tenho celular e uso computador por obrigação. Sou antidigital e tenho dificuldade'', conta.

Assim como Mazza, alguns ainda causam espanto quando dizem que não possuem um aparelho celular. São pessoas que, por dificuldades, falta de afinidade com o aparelho, aversão às novas tecnologias ou preocupação com o impacto social causado pela nova ''moda'', se recusam a entrar na era da telefonia móvel.

O jornalista e escritor Toninho Vaz, 61, já teve três celulares. Com nenhum deles se sentiu à vontade, isso quando se lebrava que carregava consigo o aparelho. ''Não gosto do celular, não tenho paciência. Sou um cara ligado nas novas tecnologias, tenho mp3, laptop. Mas já esqueci celular no táxi, entrei no cinema, esqueci que ele estava ligado. O telefone tocou e eu passei por mal educado. Só me traz inconveniência'', diz.

Ele conta que tem um aparelho que ganhou da esposa e só o utiliza para conversar com ela e com a filha. Para evitar mais problemas, ele já responde que não tem celular. ''Sou considerado um Matuzalém pelos meus amigos'', brinca.

Durante muito tempo, o orelhão também foi uma das ferramentas utilizadas pelo músico e desinger Klaus Koti, 28, para realizar contato. Avesso à novas tecnologias, ele obteve seu primeiro aparelho há aproximadamente três meses, depois de ganhar vários celulares aposentados pelos familiares, que diziam que ele precisava dessa tecnologia. ''Achava que não era uma tecnologia que iria mudar a minha vida. Dá pra viver muito bem sem celular, até mais feliz e é um gasto a menos'', afirma.

Agora, ele usa o aparelho quando faz shows fora de Curitiba. ''Ganhei da minha mãe, ativado e com crédito, aí não resisti'', conta. Mas não é apenas o celular que desagrada o músico. Para ele, muitas das novidades tecnológicas são desnecessárias, que fazem as pessoas apenas gastarem dinheiro e ainda acaba muito rápido.

''Uma necessidade desnecessária.'' É assim que o educador Rodrigo Reis Navarro, 33, considera a importância criada pelo celular. ''O celular é algo que faz parte da moda do consumismo'', diz.
Ele afirma que um aparelho móvel é sim útil e logo planeja adquirir um aparelho para a organização onde trabalha para diminuir os gastos com as ligações de telefone fixo para móvel. Mas ele leva em consideração alguns pontos que o fizeram não comprar um aparelho ainda.
Navarro considera os valores das tarifas e dos aparelhos muito abusivos, em que, mesmo assim, pessoas de baixa renda compram os aparelhos, se sentem incluídas socialmente, mas prejudicam seus orçamentos. O educador também ressalta as necessidades incutidas pelos fabricantes. ''Não se vê mais aparelhos sem câmera fotográfica e mp3''.

Outro fator destacado por Navarro é a agressão à natureza com o descarte de baterias e aparelhos antigos que são abandonados e muitas vezes jogados em lixos comuns.


'Não gosto, mas tenho cinco'
''Não sei como a gente conseguia viver sem celular.'' Quem pensa desta maneira é a dona de cinco aparelhos, a jornalista Luciana Pombo, 37. O primeiro aparelho foi comprado logo depois que a tecnologia chegou a Curitiba e o número existe até hoje.
Há aproximadamente dois anos ela, que diz não gostar de telefone, adquiriu os outros aparelhos. ''Se você não é encontrado, você não consegue a informação, aí dançou. Você perde muito em termos de informação se a pessoa não te encontra'', afirma.

Cada um dos aparelhos tem uma finalidade e dependendo da necessidade para o contato com a jornalista, a pessoa recebe um dos números. E como você faz para carregar todos esses aparelhos? ''Carrego na bolsa, sabe como é bolsa de mulher, né?!'', brinca.

Ela conta que comprou o segundo aparelho porque recebia muitas ligações, a cada instante. ''Me perturbava'', lembra. O número do aparelho novo foi passado para poucas pessoas, enquanto o outro ficava desligado e ela retornava apenas os recados mais importantes.

Luciana também revela que não se sente atraída pelas novidades dos modelos atuais. E com tantos aparelhos, ela diz que gasta muito pouco. Em torno de R$ 200,00 por mês com todos os celulares.

''Eu só recebo ligação, a não ser que seja muito importante. Não gosto de telefone, não tenho telefone fixo em casa, mas uso porque é uma necessidade.''


Professor resiste aos modismos
''Nosso cérebro tem uma enorme capacidade de adaptação, é a parte do nosso corpo mais preparada para as transformações e mudanças'', afirma o professor de Neurociência e Fundamentos Psicobiológicos do Comportamento da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Paraná, Naim Akel Filho, 54.

Este processo chamado de neuroplasticidade é o mecanismo mais importante do funcionamento cerebral. Ele possibilita a adaptação diante das novas experiências e é mais desenvolvido na infância e na juventude.

O professor explica que durante a velhice é natural que as pessoas tenham maior dificuldade em se familiarizar com novas tecnologias. ''Na juventude, a dificuldade em se adaptar às mudanças, não utilizá-las porque não consegue, é um problema'', diz. Akel se refere à decisão consciente e lúcida de achar as novas tecnologias prejudiciais.

Um dos principais fatores para esta dificuldade ou não aceitação das tecnologias é a educação e a cultura. Pessoas criadas em ambientes repressivos têm a tendência natural da neuroplasticidade bloqueada. ''Muitas religiões, por exemplo. confundem o avanço das comunicações e a ciência com fé e valores morais'', diz o professor.

Akel conta que não tem dificuldade em se adaptar às novas tecnologias. Ele afirma que usa celular, mas não admite ser alvo do jogo de marketing. Por isso resiste a modismos.

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