Cuidado: a hipertensão pode te pegar

É preciso ficar de olho na pressão alta, que muitas vezes não apresenta sintomas mas atinge boa parte da população

Folha de Londrina | 26 de abril de 2009

Matéria que fiz junto com o repórter Wilhan Santin, de Londrina. Fiquei responsável pelos personagens e a busca por alguns dados sobre a doença.

Talvez você seja hipertenso e ainda não saiba que tem a doença. É isso mesmo, a pressão alta, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), atinge em torno de 600 milhões de pessoas no mundo todo. No Brasil, estimativas indicam que pelo menos 30% da população adulta estejam com a pressão mais alta do que o normal. Quando se consideram apenas pessoas com mais de 60 anos, esse índice salta para 50%.

E o pior disso tudo é que são raros os que sentem algum mal-estar por conta da doença.''O organismo humano acaba se adaptando à hipertensão. A maioria dos hipertensos não sente nada. Estamos falando de uma epidemia que não é causada por nenhum mosquito, água contaminada, vírus ou bactéria, mas que está pegando muita gente'', alerta o cardiologista Antônio Nechar Júnior, de Londrina.

Mas como alguém se torna hipertenso? De acordo com o médico, existe uma série de fatores, porém o mais importante de todos é o genético. Boa parte dos hipertensos já tem a doença programada em seus genes, situação que Nechar Júnior compara a um barril de pólvora prestes a explodir. ''Ele está dentro do organismo, só não sabemos quando uma espoleta vai explodi-lo.'' As espoletas são os outros fatores de risco que vamos encontrando durante a vida: estresse, má alimentação, obesidade, sedentarismo, tabagismo. No entanto, isso não significa que quem não tem a predisposição genética para a doença esteja livre dela. ''Quem não tem o barril de pólvora pode fabricá-lo com os hábitos de vida equivocados'', explica o cardiologista.

Quando o ponteiro daquele aparelho de nome complicado, o esfigmomanômetro, indica que a sua pressão arterial é maior do que 120 por 80 milímetros de Mercúrio, ou 12 por 8, significa que as paredes de suas artérias estão mais rígidas do que deveriam estar, ou seja, estão perdendo a capacidade de dilatar e contrair. Com isso o coração é que acaba sofrendo.

''É como se a bomba de água do jardim estivesse ligada a mangueiras que estão com nós. Um hora ela para de funcionar. Da mesma forma, o coração que bombeia sangue para artérias endurecidas começa a crescer, hipertrofiar'', exemplifica o cardiologista. ''O nosso coração trabalha movido por impulsos elétricos. Quando esse músculo fica grande demais, a parte elétrica não funciona completamente; por isso, coração hipertrofiado é sinônimo de risco maior de morte súbita, que aumenta de 30% a 40%'', completa Nechar Júnior.

Contudo, não é só o coração que sofre. Outros órgãos do corpo humano, principalmente rins, cérebro e olhos, apanham pela falta de oxigênio, que começa a chegar de forma insuficiente até eles por causa da dificuldade de o sangue passar pelas artérias endurecidas. Pressão alta é uma das principais causas de insuficiência renal e pode causar também comprometimento da visão.

No cérebro, uma das consequências é a ''demência vascular''. A má circulação sanguínea crônica no órgão, causada pela pressão alta, resulta em micropontos de isquemia da massa cerebral, levando o doente a ter sintomas de esquecimento e lapsos de memória. ''É como se fosse um 'derrame crônico''', ressalta o cardiologista.


Desconhecimento da doença é um desafio
Doença que atinge aproximadamente 34 milhões de brasileiros, a hipertensão arterial tem como grande inimigo o desconhecimento da população a respeito de sua gravidade. Na avaliação do presidente da Sociedade Brasileira de Hipertensão, Fernando Nobre, esse cenário é ''muito ruim'', principalmente em relação às complicações cardiovasculares que a doença pode causar quando não tratada adequadamente.

Uma estimativa prevê ainda que apenas 50% dos hipertensos tenham conhecimento da doença, que 25% estejam em tratamento e 12,5% estejam com a pressão arterial controlada. O desconhecimento da doença, ou o abandono do tratamento, dificulta uma estimativa sobre a incidência.

Para o diretor do Departamento de Hipertensão da Sociedade Paranaense de Cardiologia, Osni Pereira Filho, a principal estratégia para o Dia Nacional de Combate à Hipertensão é alertar a população a respeito da doença.

Para isso, a Sociedade Paranaense de Cardiologia promove hoje uma atividade de mobilização no Passeio Público, das 9 às 17 horas, com orientações à população.

Rotina adaptada
Há um ano, a rotina de Felipe Klopffleisch, 21 anos, ganhou um novo elemento, o medicamento diário para controle da pressão arterial. Esse cuidado só foi determinado depois de uma consulta médica de rotina, que alertou o jovem para uma doença que não imaginava diagnosticar aos 20 anos de idade: a hipertensão. Até então, o estudante de Comércio Exterior não havia percebido nenhum sinal do problema.

O diagnóstico precoce evitou o aparecimento de sintomas e o início imediato do tratamento diminuiu a chance de problemas futuros. O cardiologista que acompanha Klopffleisch identificou como fatores para a hipertensão em plena juventude os casos na família, alguns quilos acima do peso ideal e a apneia durante o sono.

Como já praticava exercícios e tentava seguir uma alimentação balanceada, pouca coisa mudou no seu dia a dia para controlar a hipertensão.

Após um ano de tratamento, o jovem lembra que se assustou com o diagnóstico e o tratamento a ser seguido, principalmente por conta de sua idade. ''Achei estranho tomar remédio pelo resto da vida, é diferente, mas já me acostumei''. Agora, Klopffleisch garante que leva uma vida normal.

E é uma vida normal que o motorista Joaquim Nelson Coelho, 53, pretende levar depois que descobriu a razão de seu cansaço repentino para subir os três lances de escada de sua casa. A causa da hipertensão, conta, está nos pãezinhos a mais que costumava comer e no excesso do consumo diário de sal.

Com o diagnóstico de hipertensão feito há poucos dias, Coelho se prepara para novos hábitos alimentares e de atividades físicas. ''Tenho de diminuir a cervejinha, o sal, o açúcar e substituir o pão. Também vou começar a fazer hidroginástica''. Para Coelho, um fator importante o deixa ''à frente dos demais''. Ele não é e nem nunca foi fumante.


Cuidado com o sal
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o consumo diário de sal de uma pessoa normal deve ser de seis gramas. Para quem sofre de hipertensão arterial, a ingestão diária de sal não deve passar de quatro gramas. Porém, um estudo da Universidade de Campinas (Unicamp) aponta que os homens brasileiros consomem 17 gramas de sal por dia, e as mulheres, 13.

Presente em boa parte dos alimentos industrializados por ser um excelente conservante, o sal age no organismo humano atraindo líquido para dentro da circulação sanguínea; dessa forma aumenta o volume de líquidos no sistema circulatório, aumentando consequentemente a pressão arterial e causando o endurecimento das paredes das artérias.

Xô, estresse
As tensões de um dia corrido fazem com que o nosso corpo produza o hormônio Adrenalina, que faz com que as nossas artérias fiquem contraídas com a finalidade de levar mais sangue para o coração, que por sua vez vai possobilitar a chegada de mais oxigênio até o cérebro, deixando tudo pronto para uma reação brusca, uma explosão. É como se fosse uma herança ancestral da luta pela sobrevivência.

Praticar exercícios físicos e relaxar são as melhores alternativas para fugir do estresse, fator de risco para a hipertensão arterial. Fonte: Antônio Nechar Junior


Eu passei pelo MAPA
Em qualquer bate-papo em que a saúde entra na conversa é comum ouvir alguém se gabando: ''Minha pressão é 12 por 8''. ''Tudo bem, mas em que hora do dia?'', poderia replicar um outro mais entendido no assunto. O fato é que a nossa pressão arterial varia no decorrer das 24 horas do dia. Por isso, o Monitoramento Ambulatorial da Pressão Arterial (MAPA) é um bom instrumento para auxiliar os médicos no diagnóstico da doença.

Trata-se de um aparelho digital, que é instalado no paciente sem impedir as suas atividades normais do cotidiano, e que afere, no período de 24 horas, em torno de 80 a 100 vezes a pressão arterial, registrando todas as alterações.

De acordo com o cardiologista Evander Botura, o exame é importante para checar um fenômeno interessante que acontece no corpo humano. Ele explica que de manhã, por volta das 6 horas, ocorre uma descarga de hormônios do tipo ''catecolaminas'' no organismo, os quais promovem a aceleração do batimento cardíaco e a elevação da pressão arterial. ''A isso damos o nome de 'fenômeno do alvorecer'. É nesse horário que ocorre a maior parte dos derrames, infartos e também sangramentos nasais'', relata.

Ainda segundo Botura, à noite o normal é que a pressão diminua entre 15% e 20%. ''Essa diminuição é mau sinal, pois esse sujeito, além de hipertenso, não tem o mecanismo normal de relaxamento noturno de seus vasos sanguíneos, dessa forma fica mais propenso a complicações, principalmente cardíacas e renais''.

Contudo, apesar da importância do MAPA, o cardiologista ressalta que a aferição da pressão arterial continua sendo o melhor instrumento para o diagnóstico. ''É um exame simples e barato, que todo médico, independentemente da especialidade em que atue, devia fazer em seus pacientes. O mapeamento não precisa ser feito em todos, só em casos específicos, como naqueles que sofrem da 'síndrome do jaleco branco', ou seja, que ficam com a pressão alterada somente quando o médico vai aferi-la''.

Este repórter teve a oportunidade de passar pelo MAPA. Incomoda um pouco ficar com uma ''caixinha'' na cintura e com um manguito no braço, o qual deve ser estendido a cada vez que o aparelho começa a inflar, mas nada que chegue a atrapalhar a rotina de um jornalista. Pude comprovar a variação da pressão no decorrer do dia. A minha ficou entre 16 por 10 e 11 por 5.

Ao final do exame, o diagnóstico do médico: ''Está tudo certo com seu exame. A pressão aumentou de manhã e diminuiu à noite. Porém, você tem alguns picos durante o dia, provavelmente causados por estresse e tensão. Precisa relaxar mais.''

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