A Curitiba das muitas crenças

Todas as grandes religiões estão na cidade. Comunidades convivem com respeito em relação às diferenças

Folha de Londrina | 17 de março de 2009

Da mesquita à igreja, da sinagoga ao terreiro de umbanda, do centro espírita ao templo budista ou a tantos outros locais. Estas são algumas opções para aqueles que procuram por conforto espiritual ou proximidade com Deus, independente de como Ele é chamado.

Curitiba não deixa a desejar no quesito religião. Na cidade são realizados rituais de todas as grandes religiões organizadas. Diferentes histórias, crenças e práticas retratam a diversidade da população composta por quase dois milhões de habitantes.

Para suprir as diferentes motivações e crenças, existem na cidade 331 locais considerados templos religiosos. São estabelecimentos cadastrados com alvarás ativos na Prefeitura Municipal, que podem estar ou não em funcionamento, sem contabilizar os espaços não cadastrados.

"Quem argumenta pela falta de opções religiosas em Curitiba não conhece a cidade. É um ‘cardápio’ religioso muito grande e são muitos grupos organizados", afirma o professor e pesquisador Luiz Alberto Souza Alves, graduado em Filosofia e Teologia, que faz estudos sobre as manifestações religiosas na Capital.

De acordo com o professor, as principais religiões envolvem o Cristianismo, característica marcante dos colonizadores europeus que fizeram de Curitiba um novo lar. A religião ortodoxa se destaca por reunir fieis de forma não identificada nas demais capitais brasileiras. Também são bastante frequentadas reuniões do candomblé, umbanda, espiritismo, religiões orientais, semitas e hinduístas.

A informação é comprovada pelo último Censo Demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No ano 2000 os curitibanos identificados como católicos eram 1,121 milhão, enquanto os evangélicos eram 300 mil, os espíritas 26,9 mil e os seguidores da umbanda 2,8 mil (veja infográfico). São diferentes religiões que mantém na cidade um diálogo ecumênico e de respeito entre si.


Conhecimento contra discriminação
Mesmo diferentes, as religiões apresentam em comum a proposta de oferecer a seus seguidores caminhos de proximidade com Deus e preocupação com o bem-estar comunitário. Para o pesquisador Luiz Alberto Souza Alves, o estímulo à capacidade de convivência com as diferenças é a principal função tradições religiosas. "A função é de ser humanizadora, de dar condições de se humanizar, se equilibrar. Exercer a caridade, benevolência, amor e se comprometer com a humanidade, com a justiça e com o diferente", explica.

Ele conta que observou em Curitiba casos de resistências e intolerâncias exercidos a algumas religiões. "São representantes que possuem análise teológica fundamentalista sem a capacidade de conviver com a diferença. Mas ninguém tem o mandado divino para dizer que esta ou aquela religião é verdadeira. Somos diferentes e dentro das diferenças a gente se completa", critica.

Mas isto parece ser coisa do passado. Nenhum dos representantes entrevistados pela FOLHA afirmou ter restrições a determinados segmentos e não se sentem discriminados. "Já discutimos muito este assunto, mas hoje a gente nem liga. Estamos muito bem colocados como religião. O que poderia nos atingir não atinge mais", conta a mãe de santo do terreiro de umbanda Pai Maneco, Lucília Guimarães.

"Acreditamos na igualdade entre as pessoas e respeitamos todas as religiões. Elas devem viver como quiserem, sem imposição religiosa", complementa o roush -líder religioso- da Congregação Israelita da Nova Aliança, Ezrah Ben Levy. Ele conta, porém, que a comunidade ainda sofre agressões de grupos neo-nazistas.

Conhecimento
"O diálogo com outras religiões enriquece a nós e ao próximo, à humanidade. Só teremos o conhecimento se nos permitirmos a troca de informação e ideias, o que promove o respeito", afirma o vice-presidente da comunidade muçulmana de Curitiba, Gamal Fouad El Oumairi. "O precocento vem da ignorância", reclama Lucília.

De acordo com os representantes das religiões, a discriminação é resultado da falta de conhecimento sobre as doutrinas e pode potencializar ainda mais a garantia da dignidade a todos. "Precisamos deixar de lado as diferenças dogmáticas e nos reunirmos para efetivamente contribuir com a sociedade", sugere o padre Domenico Costella, da paróquia Bom Pastor.


O que cada sistema religioso prega
Católica
- Para o padre Domenico Costella, da paróquia Bom Pastor, no Bairro Vista Alegre, a pós-modernidade atenta para uma grande preocupação em relação à subjetividade, quando o objetivo é a satisfação dos desejos e solução de problemas pessoais. Assim, fica de lado o envolvimento com as necessidades da comunidade e da sociedade. De acordo com ele, a maior dificuldade a Igreja Católica é estimular o envolvimento da comunidade nas questões sociais. Para isso, realiza em sua paróquia diversas ações com a participação dos fieis, que atendem à comunidade de baixa renda da região. A proposta não é apenas assistencialista, mas desenvolver as capacidades e a auto-estima da população. "A verdadeira perspectiva evangélica é a comunidade. O povo pensa que a religião é missa no domingo, mas não é fácil, não compromete ninguém", conta.

Espírita - "Todos têm que dar contribuições para a sociedade. É fundamental a modificação moral do ser humano", afirma Carlos Augusto de São José, da Federação Espírita do Paraná. A doutrina espírita tem como principal proposta a justiça e a promoção da renovação social para a construção de um mundo melhor, por meio de princípios como a crença em Deus, imortalidade da alma, reencarnação e leis morais. Em Curitiba existem 72 instituições espíritas, com participantes ativos nas reuniões e iniciativas de mobilização social.

Islâmica - Com aproximadamente 5 mil fieis em todo o Paraná, a comunidade muçulmana adepta ao Islamismo se reúne para preservar e difundir sua religião. Com fé em um Deus único, seus seguidores baseiam-se na lógica da razão e no livre-arbítrio. A base da religião é a instrução em todos os aspectos da vida, para as decisões nas áreas familiar, social e econômica. "A pessoa deve ter apenas um caminho, baseado na lógica, no intelecto. Precisamos ver o resultado das ações, não só o imediatismo", afirma o vice-presidente da comunidade muçulmana em Curitiba, Gamal Fouad El Oumairi.

Judaica - Sem a necessidade de grandes encontros para a prática da religião, a comunidade
judaica segue uma cultura que tem mais de 3,5 mil anos de história. Os fieis -aproximadamente 300 famílias na Capital- seguem os 613 mandamentos presentes na Lei da Torah, que determinam as práticas de sua vida desde o nascimento até a morte, como alimentos, vestimentas, rituais de nascimento, casamentos, divórcios e até mesmo relacionamento entre patrões e empregados. O objetivo da comunidade é manter as tradições entre os fieis e viver de acordo com o que prega a religião, considerada também uma cultura. "Nossa base é separar o santo do comum. Queremos viver uma vida sagrada, para seu próprio povo, que continue sendo judeu", explica Ezrah Ben Levy.

Umbanda - Estima-se que existam em Curitiba quatro mil terreiros de umbanda, a maioria deles funciona em casas, sem registros. A procura dos fieis é pelo trabalho espiritual, desenvolvimento da espiritualidade e solução de problemas de saúde ou emocionais. A prática que completou 100 anos em novembro passado é guiada pela fraternidade, caridade e respeito ao próximo. "O preconceito é por desconhecimento. As pessoas visitam e veem que não é nada daquilo que dizem", garante a mãe de santo Lucília Guimarães.

Mais informações nos sites:
www.arquidiocesedecuritiba.org.br www.feparana.com.br www.ibeipr.com.br www.israelitas.com.br www.paimaneco.org.br www.sotozencuritiba.org www.vedantacuritiba.org.br

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