A cidadania colocada em prática

Estudantes deixam salas de lado para trabalhar com a população

Folha de Londrina | 16 de setembro de 2008

A Escola de Informática e Cidadania do Shopping Jardim das Américas (EIC-JAM) é um exemplo de que a responsabilidade social não é uma iniciativa que pode ser feita apenas pelas grandes empresas. Além de aulas de informática, alunos dos bairros Jardim das Américas, Uberaba, Capão da Imbuia, Vila Oficinas e Guabirotuba também participam de debates sobre cidadania. E o que aprendem, colocam em prática na comunidade onde vivem.

As aulas de informática são trabalhadas junto com temas como cidadania, direitos e deveres, violência, eleições, meio ambiente e legislação. Eles aproveitam a atividade sobre tabelas e gráficos, por exemplo, para calcular o quanto de lixo produzido prejudica o meio ambiente ou então, durante as aulas sobre internet, fazem pesquisas sobre os candidatos a prefeito e vereador da eleição deste ano. Os temas de debate são sugeridos pelos próprios estudantes. ''Usamos a informática para o resgate da cidadania. O objetivo é fazer o aluno participar, valorizar e respeitar a sua comunidade. E para isso ele põe a mão na massa, faz acontecer'', afirma a coordenadora da escola, Márcia Molin Pastre.

No final de cada módulo, os estudantes, que têm idades entre 14 e 90 anos, escolhem que organização da comunidade vão ajudar. Eles mesmos mobilizam a arrecadação de materiais e qual atividade será realizada. No final do mês passado, foi a vez da sede da Associação de Moradores Moradias Cajuru, uma das mais antigas de Curitiba, localizada no bairro Jardim das Américas, contar com o trabalho voluntário dos alunos. Estudantes, educadores e voluntários da EIC passaram o dia em um mutirão que pintou toda frente da associação.

O trabalho foi muito bem recebido pelo presidente da organização, Carlos Alberto Ferreira, conhecido na região como ''Seu Juca'' e que também participou do mutirão. A associação oferece atividades de contraturno, aulas de futebol e capoeira para as crianças, cursos de alfabetização para adultos e grupos de artesanato. Aproximadamente 500 pessoas da comunidade frequentam o local, que depende de doações e estava com parte da estrutura pixada e com sinais do tempo. ''A associação precisava bastante da pintura. É importante também porque dizem que aqui é violento, mas não, as pessoas precisam ver que é um espaço da comunidade. Ainda estamos procurando parceria para reformar a cancha de futebol e montar mais uma sala de aula para a alfabetização de adultos'', diz.

Para a presidente do Clube de Mães do bairro, além de uma melhoria para a associação, a atuação dos jovens é uma oportunidade de cidadania. De acordo com ela, faltam oportunidades de lazer para os jovens da comunidade. ''Precisamos de uma ocupação para os jovens. Eles têm alguns espaços de lazer, mas são longe daqui. Percebo que eles querem ficar dentro da comunidade'', conta Silvia Regina Fontes Ferreira.

Quando começou o curso de informática, o aluno José Ramos Forbeci, 66 anos, não sabia que teria que participar de trabalhos voluntários. Ele, que é delegado de polícia aposentado e se matriculou porque tinha interesse em aprender a utilizar corretamente um computador, se encantou com a inicativa social. ''Achei excelente. A gente interage, conhece as pessoas e os problemas do nosso bairro e resolvemos unidos, pelo voluntariado, que visa fazer o bem para o outro, o que é muito difícil. Dá vontade de querer ser útil'', conta.

O resultado não é apreciado apenas com a nova pintura ou a doação feita para a organização. Os próprios estudantes são exemplos das mudanças que o curso alcança. ''É uma metodologia diferente, em que a gente não ensina só informática, mas fazemos a diferença na vida deles e na nossa. A atividade de ser voluntário, a oportunidade de fazer a sua parte fica marcada pelo resto da vida'', diz empolgada a educadora Laura Mendonça. Ela conta que depois que terminam o curso, os estudantes voltam para contar o que conseguiram. ''Muitos entram no mercado de trabalho, se formam, continuam como voluntários'', diz. É o caso da jovem Joselaine da Silva Ferreira, 21, que depois de concluir o curso trabalha há dois anos como educadora na EIC. ''A gente acaba se envolvendo quando ajuda os outros.''


Iniciativa que dá certo
Há seis anos, a professora de música Márcia Molin Pastre criou a Escola de Informática e Cidadania do Shopping Jardim das Américas (EIC-JAM) utilizando uma estratégia muito comum no terceiro setor, a parceria. Ela aproveitou que seu marido é um dos gerentes do Shopping Jardim das Américas e apresentou a proposta da criação de uma escola de informática para alunos de baixa renda da comunidade.

O shopping aceitou o projeto e disponibilizou a infra-estrutura para a realização das aulas. A metodologia de ensino, Márcia buscou junto ao Comitê para a Democratização da Informática (CDI) no Paraná, uma ONG que tem o objetivo de promover a inclusão digital e utilizar a informática como um instrumento de cidadania e empreendedorismo. A indicação dos alunos é feita por organismos da comunidade.

Márcia afirma que outra proposta da escola é incentivar a inclusão social, pois é cobrada uma taxa de apenas R$ 10 em cada módulo. A inclusão também ocorre com a realização das aulas em um shopping, local onde muitas vezes os alunos não se sentiam à vontade em frequentar. ''Foi um trabalho de conscientização, não temos que ter preconceito. É um exemplo de exercício da cidadania, respeito e solidariedade.''

A professora de música, que nasceu em Alto Paraná (10 km a leste de Paranavaí) e mora há 23 anos no Jardim das Américas, conta ainda que ''desde que se conhece por gente'' é engajada no trabalho voluntário. ''Quando a gente se envolve em uma causa, é compromisso'', diz.

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