Custear dano ambiental ajuda a minimizar impacto

A valoração dos recursos naturais permite definir estratégias para recompensar a natureza. Poucas iniciativas têm se preocupado em fazer esse cálculo complexo

Gazeta do Povo | 16 de fevereiro de 2011

O uso dos recursos naturais tem um preço que poucas empresas encaram como um custo. Isso porque não é uma tarefa simples de calcular em reais, dólares ou ienes todos os efeitos negativos do corte de uma árvore, da poluição de um rio ou da emissão de gás carbônico. Uma das iniciativas mais ousadas para internalizar nos balanços contábeis o custo ambiental foi lançada pela corporação norte-americana Dow Chemical, que fechou uma parceria com a organização não governamental (ONG) The Nature Conservancy para calcular os impactos ambientais de cada decisão de negócio.

Definir quanto valem os recursos naturais e os serviços oferecidos pela natureza é um processo complexo, porém fundamental para a sustentabilidade do planeta. A prática é chamada valoração ambiental e apresenta um balanço entre o valor do recurso natural em si e o serviço que ele presta à comunidade. Com isso, estudiosos tentam corrigir uma distorção que pesa contra a conservação: é mais fácil saber o valor de um recurso quando ele é transformado em mercadoria (uma árvore serrada, por exemplo) do que quando em estado natural (um bosque que mantém uma determinada biodiversidade).

“Muitas vezes o balanço pode ficar negativo. Por isso é preciso estimar qual o valor que a sociedade atribui aos serviços naturais, mas que não são transacionados no mercado financeiro. Com a valoração é possível saber o tamanho da perda, quais as falhas e corrigir os valores negativos”, explica o diretor executivo da ONG Conservação Estratégica, Marcos Amend, que aplica a economia como ferramenta para a conservação da natureza.

Um ponto favorável dessa estimativa é a possibilidade de revisar processos produtivos que agridem o meio ambiente com o objetivo de minimizar os impactos. O levantamento dessas informações permite a criação de políticas públicas e estratégias de compensação das perdas. Na definição do professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Carlos Eduardo Young essa é a “compatibilização entre benefícios e custos”. “Quan­do se coloca no papel o resultado, é possível demonstrar que o custo da degradação é muito pior do que o lucro gerado pela atividade econômica”, diz o especialista.

Iniciativas isoladas
Iniciativas como a da Dow Chemical, que pretende colocar seu inventário de impactos ambientais lado a lado com números de faturamento e lucros, ainda são ações isoladas e que demandam investimentos pesados para o desenvolvimento de metodologias de cálculo – a Dow está investindo US$ 10 milhões (cerca de R$ 16,7 milhões) no projeto, em um período de cinco anos. Mas elas tendem a aumentar, pois governos e órgãos reguladores já estão encontrando formas de fazer com que os impactos ambientais entrem na conta das empresas. Um exemplo é o mecanismo que impõe a compra de créditos de carbono nos países desenvolvidos para companhias que aumentarem suas emissões.

“O melhor caminho para a sustentabilidade é embutir nos processos da empresa este pensamento de internalizar os custos ambientais”, diz a engenheira florestal e pesquisadora da Univer­sidade Federal do Paraná (UFPR) Ana Paula Dallas Corte. Com processos mais sustentáveis, as organizações planejam o uso consciente dos recursos, a geração e o reaproveitamento de resíduos. O investimento nessas tecnologias apresenta alto custo que é compensado quando os procedimentos tornam a empresa sustentável. “Caro é o preço da degradação. O preço para evitar e compensar é um preço justo”, complementa Ana Paula.


Uso de água de rio será cobrado no PR
O Paraná deve começar a cobrar o uso das águas que correm pelos rios do estado no próximo ano, conforme a previsão do Instituto de Águas do Paraná (Ipaguas). A medida faz parte da Lei Federal 9.433 – conhecida como Lei das Águas – e da Lei Estadual 12.726. O projeto foi aprovado pela Assembleia Legislativa do Paraná em setembro de 2009 e, desde então, o instituto faz estudos para a execução da cobrança.

Os primeiros a pagar pelo uso da água serão grandes empresas e indústrias de Curitiba e região metropolitana, entre eles a Sanepar, que usam a água da região do Alto Iguaçu. Na sequência, a cobrança passará a ser feita pelas águas dos rios Tibagi e Jordão. “Este não é mais um tabu, como era há anos. Com isso vamos incentivar o uso racional da água”, avalia o diretor de gestão de bacias hidrográficas do Ipaguas, Enéas Souza Machado. Os agricultores serão isentos de pagamento.

A determinação dos valores cobrados será baseada na quantidade de água retirada dos rios, o total consumido e os resíduos descartados no rio. Os recursos arrecadados serão usados na manutenção e conservação das áreas por um comitê responsável pelo plano de gestão das bacias.

No Brasil, a cobrança pelo uso das águas acontece desde 2003 em 19 bacias hidrográficas. Empresas e indústrias de dez estados, como São Paulo, Minas Gerais, Alagoas e Bahia, pagam de acordo o quanto consomem de água das bacias dos rios São Francisco, Paraíba do Sul e Doce, por exemplo.

O “estresse hídrico” é um dos principais fatores que determina a cobrança pelo uso da água. Em geral, a iniciativa acontece em regiões com escassez de água e áreas de grande consumo, como as regiões metropolitanas de grandes cidades. “Tendo que pagar pelo recurso, as pessoas passam a usar de forma consciente, tentando usar menos água para o mesmo processo”, explica o gerente de cobrança pelo uso de recursos hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA), Patrick Thadeu Thomas.

No ano passado o total arrecadado com a cobrança pelo uso da água de rios no país chegou a R$ 105,8 milhões. De acordo com Thomas, a medida é efetiva para o consumo consciente. “Temos visto uma redução significativa do consumo. Isso faz as pessoas refletirem sobre a água”, diz.

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